quarta-feira, 6 de agosto de 2014

NUNO DE FIGUEIREDO







DECADÊNCIA ANUNCIADA




Chegámos ao sítio da ternura, uma terra
assolada pela devastação: tudo fala em declínio
pela voz das aves neste curto país onde agoniza o
estilhaçado coração. Pintamos flores nos olhos
regamos nos dedos cravos, margaridas
e um girassol na fronte ilumina o desastre.


Mas chegámos, é o país da voz melodiosa
do veludo na língua, a nossa vocação consiste
em desenhar as palavras cativas do futuro.


É a árvore frondosa da melancolia: há a sombra
e os pássaros e a maldade das rugas
em cada fruto. Esta é a margem estreitíssima
da alegria onde as estrelas se cruzam
com as lágrimas. Este é o recanto súbito
da vida onde a ternura se apaga se a privamos
das chispas seminais do nosso lume.


Chegámos ao quintal onde a amargura
algumas vezes se rende já exausta e deixa em
seu lugar uma ilusão: o insano ventre da utopia
capaz de transformar o declínio da ternura
numa pátria vergada ao coração.




CREPÚSCULO

* PRÉMIO NACIONAL DE POESIA
FERNÃO DE MAGALHÃES GONÇALVES *

NUNO DE FIGUEIREDO

Capa - ESPIGA

Novidade


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