sexta-feira, 8 de março de 2024

sábado, 10 de fevereiro de 2024

"O Sabor do AMOR" - texto crítico do Poeta CLÁUDIO LIMA

O Sabor do AMOR - Novo livro, de Manuela Morais - Cláudio Lima - Chegado ao fim da leitura deste livro, várias, complexas e divergentes reflexões se instalam na minha mente e na minha sensibilidade. Acabo de ler um romance, como consta da catalogação na ficha técnica, com todos os ingredientes que tal género implica de jogo, ficção, artefacto/artifício literários? Ou, ao invés, à exposição autêntica e explícita de uma experiência amorosa de dois seres “de carne e osso”, mas também de grande densidade espiritual, que o destino ou a intervenção sobrenatural fizeram coincidir e consubstanciar uma união de perfeita harmonia e mútua felicidade? As perguntas são razoáveis e pertinentes. É que, desde as páginas iniciais, em que o leitor se depara com um lento e prudente ritual de encantamento e sedução próprios de uma aproximação amorosa, até às derradeiras, em que a inevitável e dolorosa separação imposta pelas leis inexoráveis da natureza põe fim a um registo conjugal venturoso, daqueles que, segundo a feliz inspiração de Vinícius de Moraes no Soneto de fidelidade, inserto no livro Poemas, Sonetos e Baladas (1946), sendo feridos de contingência e transitoriedade, aspirem a “ser infinitos enquanto durem”. São dois amantes bem identificados; duas personalidades notáveis da nossa sociedade artístico-cultural de finais do século XX e primeira década do século corrente. Dão pelos nomes de José (Manuel) Espiga Pinto, consagrado pintor-escultor e de Manuela (Maria Alves) Morais, dinâmica fundadora e gestora das edições Tartaruga, (atualmente com mais de cem títulos em catálogo) e escritora emergente em várias modalidades e crescente reconhecimento público. A natural atração que entre ambos o magnetismo cósmico operou, num fluxo alquímico e numa ágape de sublimação, conduziu-os à mútua aceitação num enlace conjugal sem reservas nem acidentes. Viveram essa experiência no limite da paixão partilhada e da bem-aventurança existencial desde março de 2000 a outubro de 2014, quando ocorre a morte de Espiga. É essa partilhada e harmoniosa vivência, mas também a dolorosa e definitiva ausência delas, o que estas páginas sentidamente expõem, num registo que, não obstante a profunda saudade subsistente, enfatiza sobretudo o lado bom, sem rotinas, tibiezas ou amuos de «duas personagens principais desta sólida e marcante história amorosa de uma simplicidade elegante» (p.21); «É necessário acender, diariamente, as lâmpadas da paixão. Namorar sem limites, sentir o desejo irresistível de abraçar, transformar as encruzilhadas em caminhos desimpedidos. E caminhar de mãos dadas, sinais inequívocos da intimidade apaixonada e esperançosa…» (p.214). A situar espácio-temporalmente esta como que cartografia de sonhos e emoções, a Autora evoca felizes viagens, por terras portuguesas e estrangeiras, favoráveis ao permanente enleio e à constante surpresa que as paisagens naturais, a monumentalidade dos edifícios e monumentos urbanos e, acima de tudo, a hospitalidade e bonomia das populações deveras os sensibilizam. Apreciadores e conhecedores das artes plásticas e arquitetónicas, palmilham grandes artérias e fascinantes jardins, perdem (ganham) horas no interior de catedrais, museus, bibliotecas etc., num clima de puro embevecimento e fascínio. Culturas, credos, costumes, idiossincrasias, - tudo observam e absorvem por grande parte desta velha Europa de tantos cruzamentos civilizacionais e tantas maravilhas artísticas que desafiam tempos e modos do devir histórico. Outro aspeto relevante desta obra, que importa referir, diz respeito ao recurso frequente às filosofias e ciências ditas ocultista, que ambos os cônjuges estudam e consideram de fundamental importância na condução da sua personalidade e do seu relacionamento. «Na demanda essencial da purificação interior.» (Alexander Roob, Alquimia e Misticismo, Livros Taschen, 2014). Muitas são as palavras e expressões em que essa corrente aflora ao longo do texto: inconsciente cósmico (p.19), consciência cósmica (pp.212 e 216), geometria sagrada (p.22), totalidade do Universo (p.24), sintonia alquímica (p.38) campos energéticos (p.46), energias vibratórias (pp.152 e 168) e outras similares e afins. Provavelmente, receberam influência nesse interesse gnosiológico-exotérico de duas destacadas figuras especialistas em tal ramo do saber, além de amigos pessoais do casal: António Telmo e Carlos Aurélio. De ambos a editora Tartaruga publicou obras: Contos Secretos (2007) e o ensaio Considerando os Filósofos (2008), respetivamente. Para a personagem Maria do Rosário, aliás Manuela Morais, José Manuel Espiga Pinto é o Príncipe, assim nomeado ao longo de todas estas 220 páginas, induzindo perpassar por elas o mavioso rumor e o doce perfume de um conto de fadas. E, sim, podemos fazer essa leitura, tal a veemência, a temperatura e o envolvimento que nos é dado testemunhar. «O amor nasceu depois de uma amizade verdadeira e de uma cumplicidade arrebatadora; cresceu e tornou-se ilimitado, infinito, infalível…» (p.37) e «O amor é o único farol da Vida que nos faz irradiar a verdadeira Luz…» (p.78). Uma leitura aliciante e envolvente. Talvez o melhor livro até agora publicado pela Autora. Janeiro / 2024

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

O Sabor do AMOR - Crítica Literária da Dra. Júlia Reis Serra.

O Sabor do Amor, de Manuela Morais. - Manuela Morais surpreende-nos com um novo livro intitulado O Sabor do Amor que a própria autora designa de romance, na Sinfonia de Abertura: “O Príncipe é a personagem principal deste romance resgatado dos escombros sombrios e agrestes, e que criou espantosas, profundas, novas, e belas raízes” (p.13). O título resulta de sensação gustativa “sabor” aliada a um sentimento “Amor”, uma espécie de sinestesia que transmite uma aliança entre o sensorial e o alquímico. A personagem que se junta ao Príncipe, Maria do Rosário, não exerce um papel secundário, pois ambos formam um todo, representado no Yin e Yang que, sendo contrários, nunca se opõem de forma absoluta, porque entre eles há mutação e continuidade. Existe um simbolismo muito forte na expressão do círculo dividido em duas metades iguais: uma branca (Yang) e outra preta (Yin). O nome Maria do Rosário contém em si um halo divino (Maria) e Rosário exprime também sacralidade, sobretudo nas regiões do Extremo Oriente, – o rosário era feito de flores ou de outros materiais mais raros e era oferecido para homenagear alguém. Assim, este livro é uma homenagem a José Manuel Espiga Pinto. Ao longo da obra, que pela sua estrutura física é romance – extensão de 226 páginas com 24 capítulos –, a nível de conteúdo, é uma bela história de amor que durou cerca de quinze anos, até ao momento da partida do Príncipe. E neste espaço-tempo de vivência, houve rosas, aromas, beijos e abraços, felicidade incontida em que Maria do Rosário não se cansa de evocar e preitear o mundo que o Príncipe lhe ofereceu, após doze anos de solidão que ela vivera, depois de ter perdido o primeiro marido. Ela, que acreditara no primeiro amor, nunca imaginou uma segunda paixão tão fulgurante na companhia do seu Príncipe; no entanto, a aproximação entre ambos foi lenta e as comunicações eram feitas pelo telefone ou escritas, sem se conhecerem presencialmente. Já conhecedora da magia da paixão e do amor, ia acendendo a luz cautelosamente, esperando uma força transcendente para lhe indicar o caminho. Assim aconteceu. No episódio, em que a vendedora do quiosque entregou a Maria do Rosário um quadro, houve uma iluminação premonitória que a conduziu à figura do Príncipe e que os leitores julgarão de acordo com os sentimentos de cada um. De localidades diferentes: o Príncipe alentejano e a Maria do Rosário transmontana, ambos tinham em comum uma admiração pela arte e esta veia artística prendia-os num abraço ascético e amoroso, juntando o profano ao divino. Desta simbiose de interesses, o Amor ia crescendo e o par preparou-se para se transformar em casal, com a celebração do casamento. Foi uma cerimónia simples, na capela de um Convento, com assento, na presença dos padrinhos e testemunhas: “Inicialmente o Príncipe achou o casamento triste. Com o passar do tempo percebeu que Maria do Rosário tinha toda a razão…, e se teve…, os seguimentos dos trágicos acontecimentos cumpriram, na perfeição, a profecia da noiva” (p.95). Todos os pormenores da indumentária e dos sentimentos estão muito bem estampados neste capítulo. O Príncipe era uma Estrela no campo das Artes e Maria do Rosário acompanhava-o nas digressões pelo mundo, onde contactavam com outros pintores e escultores citando, assim, espaços, cidades, e artistas de várias nacionalidades com quem privaram e sobre eles teciam apreciações sobre o Expressionismo, a Pintura Figurativa, o Impressionismo, os planos e construções geométricas adotados por cada um e, entre conversas eivadas de cultura, surgiam grandiosos momentos de cumplicidade durante os jantares ou lanches. Desde o Alentejo, focando essencialmente Vila Viçosa, Elvas, Beja e Évora, onde tinham amigos, até ao Norte de Portugal , mesmo na fronteira de Bragança e nas aldeias de Rio de Onor, o casal não se cansava em traçar as diferenças e semelhanças na gastronomia e nas paisagens – caso das queijadas de Murça e as tibornas de Vila Viçosa (doçaria) e o contraste paisagístico entre a montanha e a planície alentejana. Depois, os artistas amigos: no Alentejo, Carlos Aurélio e António Telmo; em Chaves, o grande Pintor Nadir Afonso. São personagens que entram no romance, ajudam a consolidar as mundividências do casal e a demarcar as várias regiões que entram na tessitura romanceada da obra. O profano e o religioso figuram também nestas páginas, citando Capelas, Monumentos e Santos que ambos adoravam: Maria do Rosário (A Anja, como o Príncipe lhe chamava) relembrou a sua infância, a procissão em honra de Nossa Senhora do Naso e o casal visitava, então, Miranda do Douro, a Sé e o Menino Jesus da Cartolinha, apreciava as Gaitas de Foles e o dialeto Mirandês. De Portugal ao estrangeiro são muitas as descrições de lugares e centros culturais evocados pela narradora omnisciente e omnipresente. Para além do tempo, personagens e espaços patrimoniais citados, há ainda referências históricas – caso do Mosteiro de Alcobaça e a lenda de Pedro e Inês – bibliotecas (Biblioteca Nacional do Palácio de Mafra), marcos da História (Olivença) e da Literatura através da evocação de Camilo Castelo Branco e Vilarinho de Samardã. Mas, a enfatizar toda esta moldura artística, está a fonte do Amor e as variações explanadas sobre tão forte sentimento que a narradora soube exprimir , na assunção de coprotagonista da história: “Cada dia , Maria do Rosário sentia mais que ali era o seu lugar, ao lado do seu amor, e de desfrutar da companhia de um fantástico humanista, com uma premonição, intuição e telepatia avançadíssimas.”(p.86). Neste espaço de expurgação de sentimentos havia um desejo de transformação do finito em infinito, uma procura incessante da quinta-essência para uma aproximação com Deus. Escreveu a autora: “O amor é, sem dúvida, o único caminho para se trilhar e brindar à nossa existência como Seres caminhantes e eternos! O amor é o verdadeiro caminho da passagem na nossa Vida de Seres Cósmicos.” (p.22). Platão e Aristóteles debruçaram-se muito sobre a cosmologia e a cosmogonia e a influência destas filosofias na explicação dos Seres, contribuindo para a desocultação de algumas dúvidas sobre a vida neste planeta e o início de outra viagem no universo. Em O Sabor do Amor assistimos ao renascer do Amor entre dois amantes, à plenitude da sua vida amorosa e à partida da personagem principal – O Príncipe – para iniciar a sua viagem no cosmos. Pode dizer-se que é a sinfonia do Amor que opera a ligação entre o Céu e a Terra. Maria do Rosário, contemplando as rosas que ficaram, vai proferindo: “são rosas, meu amor”! Júlia Serra

terça-feira, 19 de dezembro de 2023