sábado, 28 de janeiro de 2012

FERNÃO DE MAGALHÃES GONÇALVES


FERNÃO DE MAGALHÃES GONÇALVES
SER E LER MIGUEL TORGA

1 comentário:

  1. "Demasiado Tarde, Felizmente"

    (...)
    Continua fazendo versos com uma impetuosidade intratável. A influência de Antero substituíra a de Casimiro de Abreu. Apresentado a um poeta da moda e cantor da Academia, violenta o seu pudor, dá-lhe alguns dos seus textos e recebe dele um apoio irrestrito. Era a primeira vez que via autenticada a sua vocação de poeta. (...)
    Em 1928, matricula-se na Faculdade de Medicina.
    ...Seriam as suas experiências de aluno de anatomia que modificariam definitivamente o tom dessa voz. A «paróxica» brutalidade emotiva da "Balada da Morgue" alarmaria as elites coimbrãs que, desde 1927, através da «bandeira libertária» da revista PRESENÇA reassumiam de uma forma original e fundibulária o modernismo português e europeu.O referido e famoso poema será justamente a sua primeira publicação nessa revista.
    Coimbra vivia, por essa altura, uma ébria efervescência do rigor da praxe, sendo que o passatempo nocturno favorito, como conta Branquinho da Fonseca na PORTA DE MINERVA,era matar gatos à mocada e assanhar os polícias, chamando-lhes cucos. Querendo-se «civil», Adolfo nunca foi um estudante «de capa e batina» e combatia a praxe de todas as maneiras.
    Por outro lado, alojado na república Estrela do Norte, cedo se desmarca das convicções dos restantes «nortenhos espadaúdos e aplicados» que aí vivem, «fiéis às versas e às fragas» a que «queriam regressar selvagens como tinham vindo, com o canudo na mão» e para os quais «tudo era concreto e linear».Aí, no entanto, pisa um chão firme e natural sobre o qual as tertúlias constantemente pareciam querer levitá-lo.
    O cariz anárquico e libertário do grupo presencista começou por ajustar-se às exigências da sua inquietação.
    Poucos e unidos, desafiavam a rotina, o conformismo e a retórica de Portugal inteiro, traumatizavam e escandalizavam a própria Academia que tentava isolá-los através de um autêntico bloqueio panfletário.
    Mas a audácia deles queria implantar raízes no que de mais sólido e intratável aportavam à tradição e à revolução literárias: Joyce, Chestov, Bergson, Dostoievsky e Fernão Mendes Pinto sentavam-se à sua mesa de café.
    O epicentro do abalo sísmico transladava-se do café para as «tabernas da boémia», sacudindo com a violência possível e impossível as «raízes da Coimbra petrificada». Numa palavra, queriam ser a «autenticidade dum Portugal local que desejavam tornar universal». Nas palavras de José Régio, «todos amávamos ou julgávamos amar a Arte: palavra que entre nós escrevíamos com A grande e A pequeno perante os que abusivamente a maiusculavam» (...)

    In Ser e Ler Miguel Torga
    Fernão de Magalhães Gonçalves

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