DECADÊNCIA ANUNCIADA
Chegámos ao sítio da ternura, uma terra
assolada pela devastação: tudo fala em declínio
pela voz das aves neste curto país onde agoniza o
estilhaçado coração. Pintamos flores nos olhos
regamos nos dedos cravos, margaridas
e um girassol na fronte ilumina o desastre.
Mas chegámos, é o país da voz melodiosa
do veludo na língua, a nossa vocação consiste
em desenhar as palavras cativas do futuro.
É a árvore frondosa da melancolia: há a sombra
e os pássaros e a maldade das rugas
em cada fruto. Esta é a margem estreitíssima
da alegria onde as estrelas se cruzam
com as lágrimas. Este é o recanto súbito
da vida onde a ternura se apaga se a privamos
das chispas seminais do nosso lume.
Chegámos ao quintal onde a amargura
algumas vezes se rende já exausta e deixa em
seu lugar uma ilusão: o insano ventre da utopia
capaz de transformar o declínio da ternura
numa pátria vergada ao coração.
CREPÚSCULO
* PRÉMIO NACIONAL DE POESIA
FERNÃO DE MAGALHÃES GONÇALVES *
NUNO DE FIGUEIREDO
Capa - ESPIGA
Novidade